Extrajudicialização dá cara nova aos cartórios e reduz carga do Judiciário

Para o advogado e empresário Marcelo de Freitas e Castro a velha previsão do fim dos cartórios no Brasil, amparada pelo apelo à desburocratização, tem dado lugar a uma tendência no sentido oposto, impulsionada pela necessidade de reduzir o acervo do Poder Judiciário.

Tradicionalmente associados à ineficiência e à morosidade, os serviços notariais e de registro estão se transformando, ganhando cada vez mais autonomia para lidar com questões antes exclusivas dos tribunais, que tentam dar agilidade a processos relativamente simples, mas, ainda assim, trabalhosos. O fenômeno tem nome: extrajudicialização.

O episódio mais recente dessa mudança ocorreu no último dia 20, quando o Conselho Nacional de Justiça editou um ato normativo para permitir que inventários, partilhas de bens e divórcios consensuais sejam feitos em tabelionatos de notas ainda que envolvam herdeiros com menos de 18 anos ou incapazes. Trata-se da Resolução 571/2024. 

A possibilidade de realizar esses atos de forma extrajudicial reduz a sobrecarga do Judiciário, permitindo que casos possam ser solucionados de maneira mais rápida e eficiente diretamente nos Cartórios de Notas, já conhecidos por realizar divórcios consensuais e inventários sem menores ou incapazes.

Divórcios e inventários

Em São Paulo, a medida do CNJ deve elevar a quase 60% a quantidade de divórcios feitos em tabelionatos, , segundo a seccional paulista do CNB. Atualmente, também conforme a entidade, 77,5% dos atos são feitos pela via judicial e 22,5%, pelos tabeliões, isso quando há consenso entre as partes e não há menores envolvidos.

No caso dos inventários, a mudança deve resultar em maior celeridade, já que a tramitação não vai depender de homologação judicial. Será exigido apenas que haja consenso entre os herdeiros e que, no caso de menores de idade ou de incapazes, o procedimento lhes garanta a parte ideal de cada bem a que tiverem direito, sob supervisão do Ministério Público.

A resolução também ampliou os poderes do inventariante nomeado extrajudicialmente, que poderá levantar valores para pagar despesas do espólio. Além disso, ela criou a possibilidade de lavratura de inventário extrajudicial mesmo quando o convivente sobrevivente for o herdeiro sucessor, desde que a união estável esteja previamente reconhecida.

Tendência em normas

A tendência de extrajudicialização já vem desde 2004, quando a edição da Lei 10.931 permitiu a retificação administrativa nos Ofícios de Registro de Imóveis.

O certo é que a legislação avançou para autorizar a lavratura de inventários e divórcios que não envolvessem menores ou incapazes (Lei 11.441/2007); o registro tardio de nascimento para maiores de 12 anos sem a necessidade de intervenção judicial (Lei 11.790/2008); e a retificação nos Ofícios de Registro Civil sem intervenção judicial e sem a necessidade de oitiva do representante do Ministério Público (Lei 12.100/2009 e Lei 13.484/2017)

Também surgiram a possibilidade de mudança de prenome extrajudicialmente para os maiores de 18 anos e hipóteses de alteração de sobrenome sem intervenção do juiz, graças à Lei 14.382/2022.  A a Lei 14.711/2023), garante a execução de dívida por hipoteca e passou a ser viável extrajudicialmente.

Direito Imobiliário

É importante ressaltar que o Direito Imobiliário da permissão para pedidos extrajudiciais de usucapião e a permissão para pedidos de adjudicação compulsória (Leis 13.105/2015, 13.465/2017 e 14.382/2022). São exemplos significativos, que têm alavancado a atuação dos cartórios em competências antes exclusivas do Judiciário.

Essas duas mudanças transformaram a atuação dos cartórios na área, uma vez que, até então, o serviço de registros era utilizado apenas pela obrigatoriedade de formalizar transações imobiliárias.