O Governo federal publicou em 28 de dezembro de 2023 a MP 1.202/23 tendo por objeto (i) restrições à compensação de créditos tributários decorrentes de ação judicial, (ii) reoneração gradual da folha de salários entre 2024 e 2027 e (iii) revogação gradual do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE.
Segundo o advogado e empresário Marcelo de Freitas e Castro a redução ou de supressão de benefícios ou de incentivos fiscais, o STF entende que tais situações configuram majoração indireta de tributos, devendo respeitar a princípio da anterioridade tributária, geral e nonagesimal (STF. Plenário. RE 564225 AgR-EDv-AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 20/11/19). Ou seja, não apenas a majoração direta de tributos atrai a eficácia da anterioridade, mas também a majoração indireta decorrente de revogação de benefícios fiscais.
Sendo assim, cabe analisar o impacto da MP 1.202/23 em relação ao PERSE.
O PERSE foi criado pela lei 14.148, de 3 de maio de 2021 tendo como objetivo compensar setores da economia prejudicados por medidas de combate à pandemia da Covid-19. Referida compensação consistiu na redução a zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Devemos ressaltar que o programa tinha prazo para finalizar, ficando reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta lei, as alíquotas dos tributos mencionados.
No caso do PERSE, o Governo Federal apontou que o benefício foi concedido por conta da pandemia e projetava uma renúncia da ordem de R$ 20 bilhões em cinco anos, sendo R$ 4 bilhões por ano. Ocorre que apenas em 2023, o Perse já ultrapassou a casa de R$ 16 bilhões.
De olho nesses expressivos números, a MP 1.202/23 buscou promover relevantes alterações no programa, mas não determinou a imediata extinção do PERSE, uma vez que foi previsto um escalonamento para a retomada dos recolhimentos: a) Para a CSLL, PIS e COFINS a retomada deve ocorrer em 1º abril de 2024; b) Em relação ao IRPJ a retomada deve ocorrer em 1º de janeiro de 2025.
Outra questão que merece ser debatida é saber se as empresas que faziam jus à alíquota zero de acordo com os critérios da lei 14.148/21 e da Portaria 7.163/21 poderiam ser excluídas do benefício antes do fim do prazo previsto para sua fruição ou se, diversamente, possuem direito adquirido ao benefício.
De acordo com o artigo 178 do CTN, “a isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104“.
Como se nota do dispositivo, a isenção por prazo certo e condicionada gera direito adquirido ao beneficiário, o que impede sua revogação antes do prazo estipulado para sua fruição.
O tema conta, inclusive, com enunciado da Súmula 544 do STF, apontando que “isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas”.
No caso do Perse, a alíquota zero foi concedida pelo prazo 60 meses (artigo 4º da lei 14.148/21) sendo condicionada ao cumprimento dos requisitos previstos no artigo 2º da lei 14.148 e (originalmente) na Portaria ME 7.163. Ademais, há elementos na legislação e na jurisprudência para se sustentar haver caráter oneroso no Perse, ainda que o benefício não exija contraprestações específicas e diretas por parte do contribuinte.
Sendo assim, essa revogação poderá vir a ser questionada judicialmente, especialmente em função do artigo 178 do CTN, segundo o qual não podem ser livremente revogados os benefícios fiscais concedidos por prazo certo e mediante certas condições.